A compra direta nas licitações e o fracionamento indevido da despesa: Erros a serem evitados.

erros nas licitações

 

     Como se sabe, a regra é a licitação, sendo a sua não utilização apenas nos casos expressos em lei, consoante o artigo 37, XXI da Constituição Federal de 1988, regulamentado pela Lei 8.666/93. A lei geral de licitação autoriza a não realização de licitação apenas nas hipóteses dos artigos 17 (alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público), 24 (dispensa de licitação) e 25 (hipóteses de inexigibilidade).

     Rotineiramente, nos órgãos públicos, as hipóteses de licitação mais utilizadas são as previstas no artigo 24, incisos I e II, denominadas de “compra direta” ou “compra livre”, sendo aqui que ocorrem os principais vícios, a exemplo da fragmentação indevida de despesa. Mas, o que se entende por fragmentação de despesa?

     A fragmentação ocorre quando se faz várias compras de um mesmo objeto em parcelas pequenas para que se ajuste ao valor previsto na lei para a compra direta, que hoje, tendo em vista o estado de calamidade por conta da Covid-19, para os casos de obras e serviços de engenharia, o valor é de até 100 mil reais e no caso de bem e demais serviços, o valor é de até 50 mil reais.

     Outra hipótese, também, é a compra por dispensa até chegar ao valor permitido na lei e depois faz-se um pregão. Nesse caso houve fragmentação, pois o órgão, se tivesse planejado, já saberia de antemão que determinado produto, a depender da quantidade e valor, seria objeto de licitação e não de compra direta. Dessa forma, já se deveria fazer a modalidade de licitação para o caso e não comprar por dispensa. Inclusive, com a possibilidade de se obter até mais economia comprando-se em uma quantidade maior e mediante disputa (os lances).

     Em muitos locais, muitas vezes por falta de conhecimento, os solicitantes de compras dos órgãos entendem que basta a requisição estar dentro do valor limite de dispensa, sem pensar que se deve considerar o valor total da despesa previsível para o exercício e por grupo de materiais ou serviço e não o valor de cada requisição.

     Nesse caso, pensa-se, muitas vezes, que o pessoal do departamento é que está criando óbices para a compra, quando, na verdade, está se protegendo o solicitante da feitura de uma compra em desacordo com a lei. Há diversos acórdãos dos Tribunais de Contas em relação ao fracionamento indevido de despesa a exemplos:

Acórdão nº 183/2019 – TCU – Plenário.

            9.13. recomendar (…), que:

(…) 9.13.2. nas licitações para a aquisição de bens e serviços comuns, adote a modalidade de pregão eletrônico; (…)

            9.13.4. planeje adequadamente as suas aquisições/contratações, evitando o fracionamento de despesas e compatibilizando-as com a capacidade orçamentária do município, de sorte a permitir a obtenção de preços mais vantajosos nos certames.

Acórdão nº 3.412/2013 – TCU – Plenário.

            Consoante orientação do Plenário do TCU, as aquisições de produtos de mesma natureza devem ser planejadas de uma só vez, pela modalidade de licitação compatível com a estimativa da totalidade do valor a ser adquirido. A ausência de planejamento e a utilização do art. 24, inc. II, da Lei nº 8.666/93 para justificar a dispensa de licitação, nesses casos, caracterizam fracionamento indevido de despesa. 

     No entanto, tanto em caso de dispensa como no de realização da licitação devem ser observadas regras jurídicas que estabelecem os critérios necessários na escolha do futuro contratado e montagem do processo. Sim, montagem do processo, pois é preciso que se tenha um, com a capa, número, solicitação, justificativa, autorização, reserva orçamentária, empenho e, se for o caso, o contrato e respectiva publicação.

     Nos casos de dispensa dos incisos I e II do artigo 24 da Lei 8.666/93 não há necessidade de que haja o parecer jurídico, mas é necessária a pesquisa de preços, conforme já mencionado em acórdãos do TCU, a exemplo dos elencados abaixo:

TCU. Acórdão 1607/2014-Plenário:

Em procedimento de dispensa de licitação, devem constar, no respectivo processo administrativo, elementos suficientes para comprovar a compatibilidade dos preços a contratar com os vigentes no mercado ou com os fixados por órgão oficial competente, ou, ainda, com os que constam em sistemas de registro de preços.

TCU. Acórdão 2380/2013-Plenário:

É obrigatória, nos processos de licitação, dispensa ou inexigibilidade, a consulta dos preços correntes no mercado, dos fixados por órgão oficial competente ou, ainda, dos constantes em sistema de registro de preços. A ausência de pesquisa de preços configura descumprimento de exigência legal.

Diante do exposto, importante se faz observar os procedimentos corretos quando da aquisição por dispensa com base nos incisos I e II do artigo 24 da Lei 8.666/93, as chamadas “compras diretas”, observando-se a montagem correta do processo constando a solicitação, justificativa, pesquisa de preços, reserva, autorização, empenho e, se for o caso, o contrato e respectiva publicação e também o cuidado de não fragmentar a despesa comprando por dispensa quando deveria ser adotado o pregão, por exemplo.

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Gislany Gomes Ferreira
OAB 186.553

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